sexta-feira, 21 de junho de 2013

A ciência e os suplementos

A indústria de suplementos move montanhas e ninguém duvida. Digite "suplementos" no Google e você verá que, na primeira página inteira e ocupando boa parte das seguintes, sua pesquisa vai levá-lo a lugares onde comprar essas maravilhas para melhorar o seu desempenho e ter aquele corpo sarado, nada de estudos que comprovam ou negam a eficácia dos suplementos. Nas academias, treinadores fazem coro junto à indústria para que você compre e consuma tudo o que der! Nas lojas especializadas, é possível encontrar uma variedade enorme de suplementos alimentares. Experimente olhar para o vendedor e perguntar "o que faz efeito?", e você sairá de lá com potes e potes das "melhores e mais modernas marcas" de suplementos esportivos. Arnold usou este, o Mr. Ollympia tomou aquele. Caseína, albumina, glutamina, BCAA, creatina, Whey e Soy Protein são aquilo que falta na sua dieta para você ir mais longe. O assunto se resume a isto: compre suplementos ou todo o seu suor será em vão.

Mas o que realmente importa é o que a ciência sabe até hoje sobre suplementos e o que os estudos científicos têm para nos dizer. Pronto para sair do mundo de fantasia dos suplementos milagrosos e descobrir os fatos?

Comecemos com os pesquisadores Steven Nissen e Rick Sharp que, em uma meta-análise*, encontraram mais de 200 suplementos alimentares, os quais supostamente aumentariam o ganho de massa magra sem o aumento excessivo de gordura no treinamento de musculação. Os autores concluíram, nesse estudo, que apenas a creatina e o HMB obtiveram resultados significativos sobre os ganhos de força e aumento de massa muscular. Porém, tal estudo, apesar de servir de base para vários pesquisadores da atualidade, foi realizado há algum tempo e  você provavelmente vai usar esse argumento para justificar o seu armário lotado de suplementos.

Então, vamos falar sobre a revista Super Interessante, que no mês de maio divulgou uma reportagem intitulada "A química da academia". Nela vemos um infográfico comparativo de três indivíduos. Eles foram medidos e avaliados por um período de dois anos, possuíam o mesmo peso, altura e alimentação. Os três começaram a malhar juntos, cinco vezes por semana. Um deles não tomou nenhum tipo de suplemento ou anabolizante, o outro ingeriu apenas suplementos (creatina e Whey) e o último consumiu apenas anabolizantes. O primeiro indivíduo (aquele que nada consumiu) teve, em dois anos, o mesmo progresso obtido em dois meses pelo rapaz que consumiu anabolizantes (nada surpreendente, convenhamos). Além disso, sua massa magra (do primeiro indivíduo) aumentou em 5 kg, em dois anos. Já o rapaz que utilizou suplementos teve um ganho de 8kg de massa magra, e o último sujeito estudado, que fez uso de anabolizantes, aumentou sua massa magra em 14 kg no mesmo período. Incrível, não?  

Porém, a reportagem não explica o protocolo de treinamento utilizado na pesquisa, nem houve a publicação de um estudo sobre o tema, como eles mesmos me afirmaram por e-mail, quando questionados sobre o assunto. E você, caro leitor, que não malha só os músculos, mas também exercita o cérebro, sabe que uma pesquisa que utilizou apenas três "amostras" para concluir algo tão polêmico é bastante duvidosa! Apesar disso, ao falarmos em creatina, principalmente, outros estudos corroboram de certa forma tais resultados divulgados pela revista.

O pesquisador Tácito Pessoa de Souza Junior, Doutor em Ciências do Esporte pela UNICAMP, junto com sua equipe, realizou um estudo para verificar as alterações na resultante de força máxima dinâmica e variáveis antropométricas em universitários sob os efeitos da creatina. Eles concluíram que alterações positivas na RFMD (resultante de força máxima dinâmica) e na massa corporal foram mais significativas no grupo creatina em comparação ao grupo placebo.

Ainda em relação à creatina, Olsen (2006) encontrou aumento na quantidade de células satélites e mionúcleos em indivíduos que receberam creatina durante 16 semanas de treinamento de força, demonstrando diferenças significativas perante o grupo controle.

WHAT??? Você provavelmente leu o parágrafo anterior e não entendeu nada! Vou explicar melhor. Segundo Kadi (2004), a musculação pode aumentar a proporção de células satélites e o número de mionúcleos nos músculos treinados, de forma que esse mecanismo é um importante fator de hipertrofia muscular. O que Olsen concluiu com seu estudo é que sem a creatina, apenas com a musculação, o aumento no número relativo de células satélites foi de 44% no grupo analisado, já no grupo que fez musculação com a suplementação de creatina, o aumento foi de 99%.

Você deve estar se perguntando por que estamos falando só da creatina. Porque a creatina é o suplemento mais estudado e o que mais demonstrou resultados em estudos científicos. O HMB, também citado por Nissan e Sharp, possui menos pesquisas a seu favor, e a maioria dos estudos foram publicados apenas na forma de resumos em congressos, com carência de detalhes sobre os protocolos de treinamento.

Entretanto, destaca-se o estudo de Jówko, o qual demonstrou que a suplementação de creatina combinada com HMB promoveu maiores ganhos de força e massa magra em sedentários submetidos a um programa de treinamento de força. Porém, os mesmos resultados não foram verificados em indivíduos que já praticavam musculação. Outro estudo brasileiro também chegou a conclusões parecidas.

Existem pesquisas sobre óxido nítrico (NO)L-carnitina e L-tartrato (LCLT), aminoácidos e proteínas, leucina e outros, mas alguns estudos são controversos, segundo os especialistas, por causa da dieta e protocolos de treinamento, assim como certos estudos são únicos, não possuindo na comunidade científica outras pesquisas que confirmem os resultados encontrados.

Portanto, a creatina possui pesquisas interessantes sobre sua suposta eficácia, todos os outros 199 (ou mais) suplementos possuem pouco embasamento científico ou nenhum. Mas antes de correr até a farmácia para comprar o seu pote de creatina, saiba que:

> Em ensaios de cinética proteica com isótopos radioativos, a suplementação de creatina não alterou o balanço proteico em curto prazo, mesmo quando combinada a uma sessão de treinamento de força. Ou seja, o aumento de massa magra, por um curto período de tempo, deve-se, sobretudo, à capacidade de retenção hídrica que a creatina possui.

> Por um período de tempo maior, a creatina seria capaz de aumentar o volume de treinamento, proporcionando, consequentemente, maiores ganhos de força e hipertrofia. No estudo de Syrotuik, os indivíduos que receberam creatina, mas que se exercitaram com a mesma carga absoluta que o grupo placebo, apresentaram as mesmas respostas para força e hipertrofia. Isso quer dizer que os benefícios da creatina dependem do aumento do volume de treinamento.

> Há evidências de que a creatina é capaz de aumentar a força e a massa magra em pacientes com doenças neuromusculares, como a distrofia de Duchene. Há outros estudos relacionando creatina e HMB com a melhora em condições de pacientes com doenças que causam atrofia e perda de força, contudo, tais pesquisas usam um baixo número amostral e não nos ajudam a tirar conclusões satisfatórias.

> A ISSN, International Society of Sports Nutrition, em 2007, por meio de um posicionamento oficial, confirmou ser a creatina, na dosagem recomendada, o suplemento mais eficiente para o ganho de massa muscular.

É relevante saber que a maioria dos pesquisadores concordam que os estudos em torno da influência dos suplementos sobre o processo de hipertrofia são limitados em vários pontos. Grande parte dos estudos publicados não possuem critérios quanto à quantificação das substâncias ingeridas, à qualidade dos suplementos, ao controle nutricional ou aos protocolos de treinamento, também não há rigor com os indivíduos usados para os experimentos. Muitas vezes há confusão de respostas agudas com crônicas, respostas hormonais consideradas como garantia de hipertrofia muscular. Ou seja, por mais estudos que existam, ainda há dúvidas sobre a verdadeira eficiência dos suplementos e da creatina.

Por fim, se você for suplementar qualquer coisa, converse antes com o seu nutricionista. Mas tenha em mente que nada vai revolucionar a sua forma física se você continuar sentado no sofá assistindo à televisão! Pare de procurar o caminho mais fácil tomando vários suplementos; hipertrofia é, principalmente, descanso, dieta e treino duro, então, GO HARD, OR GO HOME!!

Para saber mais:

http://professorwilliamcouto.blogspot.com.br/2008/06/creatina-e-aumento-da-massa-magra-como.html

http://www.brjb.com.br/files/brjb_129_4201012_id2.pdf

*meta-análise: é feita com técnicas estatísticas e combina, em uma espécie de resumo, os resultados de estudos independentes sobre uma mesma questão.

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